Inteligência Artificial: onda de aplicativos e programas invade nosso dia a dia e divide opiniões

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A Revista Elitte conversou com um especialista da área para saber mais sobre o assunto do momento.

Desde assistentes virtuais em nossos smartphones até algoritmos avançados que alimentam as redes sociais, a Inteligência Artificial (IA) está se infiltrando em quase todos os aspectos de nossas vidas, levantando questões fundamentais sobre privacidade, ética e até mesmo nossa própria humanidade.

Pode não parecer, mas o texto acima de introdução dessa matéria foi escrito por uma IA, o ChatGPT, lançado no final de novembro de 2022. Essa e outras ferramentas têm dividido opiniões e causando espanto e admiração frente ao que a tecnologia pode nos oferecer.
Para falar um pouco sobre a Inteligência Artificial, a Revista Elitte conversou com o professor do Departamento de Ciência da Computação da Universidade Federal de Lavras (DCC/UFLA), Eric Fernandes de Mello Araújo. O docente é doutor pela Vrije Universiteit Amsterdam, Holanda (2018) e líder do grupo de pesquisa BILbo (Behaviour Informatics Laboratory). Seus principais tópicos de pesquisa incluem Modelagem Baseada em Agentes (MBA) para uso em estudos de comportamento humano, contágio social, comportamento social, suporte cognitivo e afetivo, redes sociais, computação aplicada à saúde e ao estilo de vida e criminologia.

Professor, a IA está presente em nossa vida há muito mais tempo do que imaginamos. Está correto?

A IA surgiu há bastante tempo, e temos histórico de programas de computador visando criar sistemas inteligentes da década de 1950! Quando os primeiros computadores surgiram, e pesquisadores começaram a se lançar na tarefa de criar um programa que tivesse a capacidade de fazer o que humanos fazem, criou-se um “boom” muito grande, com altos investimentos nas pesquisas, que perduraram até o fim dos anos 1960, aproximadamente. Porém, o que se viu entre os anos 70 e os anos 2000 foi uma grande decepção com as pesquisas em IA, em um período longo de hiato onde quase não se falava de IA, a não ser nos seriados e filmes de ficção científica da época.

Por que agora, então, a IA voltou com tudo, professor?

Porque, apesar de já existirem modelos matemáticos e propostas de programas capazes de resolver vários problemas como um humano resolveria, faltava antes um poder computacional e espaço de memória para a quantidade de dados e processamento necessários. Os anos 2000 trouxeram a internet e uma grande reviravolta na construção de computadores mais potentes e com mais espaço. A capacidade de armazenamento dos computadores dobrou ano a ano por décadas.

Existem tipos de Inteligência Artificial?

Então, para responder esta pergunta, primeiro precisamos entender o que é Inteligência Artificial. A IA é um campo da Ciência da Computação que busca criar agentes inteligentes com capacidade de tomar decisões autônomas para resolver problemas. Esta seria uma forma de colocar, porém, temos diversas formas de IA. Se pretendemos criar um robô que tire pessoas de um prédio em chamas, por exemplo, precisamos de um robô que tenha capacidade de tomar decisões perfeitas, e não um computador com traços humanos de medo ou insegurança. Estes são sistemas inteligentes que funcionam de forma puramente racional. Mas temos também agentes inteligentes, cuja utilidade depende da existência de traços humanos. Um chatbot, um programa para conversar com pessoas buscando auxiliá-las em questões psicológicas precisa ter traços de empatia e capacidade de expressar emoções. Neste caso, estamos falando de computadores que se comportam como humanos.

Vemos que alguns aplicativos usam nossas fotos fazendo sucesso nas redes sociais. Do seu ponto de vista, há riscos de expor nossas imagens assim para a tecnologia?

Há riscos, e não são poucos! Toda foto que você disponibiliza na internet fica armazenada na base de dados da empresa que fornece o serviço, e a forma como esta empresa pode ou irá utilizar sua foto sempre é obscura, passando por termos de serviço que quase ninguém lê. Mais ainda, muitas vezes sua foto é utilizada para fins de marketing personalizado, onde você passará a ser bombardeado com ofertas de produtos que se encaixam dentro do perfil traçado por um sistema inteligente criado para esta finalidade. Há de se ter sempre em mente que os aplicativos “gratuitos” cobram um preço: seus dados.

O ChatGPT tem revolucionado a escrita, porém há quem diga que ele tenha tirado o emprego de muita gente. É possível falarmos que a IA vai nos substituir um dia?

Há várias tecnologias que tiraram o emprego de muita gente. É uma tarefa muito comum em países desenvolvidos de criar tecnologias que executem tarefas insalubres, ou que gerem problemas de saúde em humanos.

O problema não está nos empregos “perdidos”, mas na forma como iremos lidar com as mudanças causadas na sociedade a partir de novas ferramentas que não irão simplesmente desaparecer, mas que vieram pra ficar.

Eu convido os leitores a refletir sobre a quantidade de horas de trabalho que seriam economizadas pelo jornalista ou editor de um jornal que tem uma ferramenta que não comete erros de gramática ou de grafia. Ou quanto tempo seria economizado com traduções de artigos científicos ou livros com uma ferramenta que tenha a capacidade de analisar o contexto e usar os termos corretos todas as vezes. Assim, eu vejo as ferramentas generativas, como a OpenAI, como uma grande oportunidade para reajustarmos o uso do nosso tempo, e usarmos este tempo que teremos a mais para exercer nossa criatividade, coisa que a IA ainda não é capaz de fazer!

Recentemente, uma fabricante de automóveis utilizou a IA para recriar a cantora Elis Regina em uma campanha publicitária que dividiu opiniões. Esse caminho poderia ser usado para quem sabe no futuro recriar memórias de nossos entes queridos que já morreram. O que você acha disso, professor?

Há uma corrente forte dentro da IA que visa a imortalização das pessoas por meio de IAs que simulem humanos quando em vida. Com o avanço na área de robótica, há ainda os que se propõem a criar até mesmo androides que tenham traços físicos de pessoas. A pergunta que temos que nos fazer é “onde nos perdemos no caminho?”, ou “onde falhamos enquanto humanidade para querermos ter tanto controle sobre a morte?”. As novas tecnologias certamente trarão possibilidades, mas resta-nos a reflexão sobre quais delas nos convém, quais nos desumanizam, e quais são realmente úteis para o bem-estar da humanidade. Eu, como um bom professor de Inteligência Artificial, jamais trocaria o abraço de minha esposa, ou o sorriso do meu pai, por qualquer protótipo que vise substituí-los. Prefiro minha memória falha destes momentos.